Marcelo Segreto, cantor, compositor e idealizador da Filarmônica de Pasárgada, lançou na última semana, em todas as plataformas digitais, o primeiro EP em carreia solo, “América América”.
O projeto nasceu a partir da premiação no ‘Concurso Ibero-Americano de Composição de Canção Popular Ibermúsicas 2018’, para o qual deveriam ser compostas três canções. Tendo em vista o caráter do concurso e do Programa de Fomento Ibermúsicas, a América Latina acabou virando o tema também do EP. “Eu quis seguir a proposta do concurso e pensar sobre a união da América Latina na música. Estamos tão perto e tão separados”, conta Segreto.
As faixas “1492”, “Tordesilhas”, com participação da cantora argentina Loli Molina, e “América, América”, foram arranjadas em 2019, processo no qual foram fundamentais os encontros com Marcus Preto, diretor artístico do EP. A ideia era fazer arranjos mais acústicos e líricos, inclusive na produção visual dos 3 clipes que serão disponibilizados em breve.
O EP foi gravado em fevereiro de 2020 e produzido por Tó Brandileone, no Estúdio do Tó, em São Paulo. A capa foi uma criação de Manuela Eichner. Luiza Nunes, ao lado de Segreto, foi a responsável pela produção executiva de todo o projeto.
Faixa a Faixa por Marcelo Segreto
“1492” – A primeira canção do EP é um retrato onírico do Brasil e da América Latina, como um sonho ou um delírio. A letra cita uma mistura de tempos e espaços (Marielle e os helicópteros de Pinochet, que atiravam corpos ao mar, o Carnaval e a anti-política ambiental do governo brasileiro atual). Por causa dessa ideia de mistura delirante de fatos históricos, a canção também faz uma referência ao tema da “máquina do mundo”. Esse é um tema muito legal, presente na literatura (tem nos “Lusíadas”, do Camões, em “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, num poema do Drummond, entre outros autores). É quando a personagem ou eu-lírico do poema tem, de repente, uma visão onírica do mundo e da história, como se o segredo do universo fosse mostrado a ela. Isso tem a ver com essa ideia da canção de passar pela história da América Latina… a partir de 1492, quando tudo começou a dar ruim.
“Tordesilhas” – A partir desse símbolo da separação entre os países na América Latina, que é a linha traçada pelo Tratado de Tordesilhas, essa canção faz uma metáfora entre uma relação amorosa e a relação que o Brasil tem com os países vizinhos (uma sensação de distanciamento, separação, de impossibilidade do encontro). A gente se sente tão perto e tão longe ao mesmo tempo, né? Por isso, a letra faz uma brincadeira com os versos. Cada verso tenta tocar o verso seguinte mas não consegue, como uma pessoa tentando tocar a outra. Ou então, os versos aparecem mutilados, sem a última sílaba, como os países latino americanos (que fazem parte de um todo, mas estão também despedaçados, separados…ou que só se completariam com a presença um do outro). No refrão, rola mais ou menos a mesma ideia, há um cânone (repetição em defasagem da mesma melodia), que reforça essa ideia de separação, de tentativa sempre fracassada de encontro). Pensando nisso, a participação da Loli Molina foi muito especial, não só pela beleza que é o canto e o talento dela, mas também por essa sensação de afastamento, de dividir essa canção com uma artista de um outro país da América Latina.
“América, América” – a faixa mantem essa pegada de relacionar o tema de uma separação amorosa com o tema da separação entre o Brasil e os países da América Latina. Por isso, o título reforça esse lance de que são duas Américas, separadas por vírgulas. Pra compor essa faixa, pensei bastante naquela canção do Milton “San Vicente”. Acho que na época rolava um movimento em prol de canções latino-americanas engajadas numa ideia de identidade entre os países. Enfim, a música segue nessa mesma onda da Tordesilhas: falar do desencontro, do fato de que estamos tão distantes e tão próximos ao mesmo tempo… praticamente o disco é uma propaganda da URSAL 🙂
Ouça: