Por que o estupro é um crime ainda tão comum no Brasil? Por que a vítima muitas vezes é tão – ou mais – julgada pela sociedade do que o próprio criminoso? Por que é tão difícil fazer uma denúncia e tantas vítimas sofrem caladas? Por que a maioria dos estupros, ao contrário do que muitos acreditam, não acontece em ruas desertas, tarde da noite, mas dentro das casas, das escolas, dos escritórios, das igrejas, no transporte público, em plena luz do dia? Até quando o medo fará parte da rotina das mulheres? São essas e muitas outras perguntas que a jornalista Ana Paula Araújo responde em Abuso, uma obra corajosa e sem meias-verdades sobre como pequenas atitudes tão entranhadas em nossa sociedade e repetidas de forma quase automática na criação de meninos e meninas geraram uma verdadeira cultura do estupro no país.
O livro é resultado de quatro anos de pesquisas, viagens pelos quatro cantos do país, e mais de uma centena de entrevistas com vítimas e seus familiares, criminosos, juízes, desembargadores, psiquiatras, psicólogos e outros especialistas. Ana Paula analisa casos que chocaram o Brasil, de anônimos e pessoas públicas, e outros tantos que, apesar de bárbaros, ficaram perdidos em meio ao constrangimento das vítimas e à lentidão da lei para mostrar como o estupro afeta toda a rede familiar e deixa marcas indestrutíveis na vida de quem o sofre.
A jornalista também acompanha todo o caminho das vítimas por justiça, analisa o processo de culpabilização delas pela sociedade e mostra como raramente a legislação do país, criada para dar todo o suporte necessário a quem sofre esse tipo de violência, é cumprida.
“A intenção do livro é alertar e fazer refletir sobre os casos de abuso sexual. A maioria deles acontece exatamente dentro de casa, contra crianças, e os criminosos são pessoas próximas e que têm uma relação de superioridade com a vítima, podem ser parentes mais velhos, vizinhos, amigos da família.”, conta a autora.
O estupro é uma violência que não escolhe lugar, classe social, circunstância nem horário. Mais do que o desejo sexual, o estupro tem a ver com poder, com a dominação do mais fraco pelo mais forte. Consequentemente, as mulheres, de todas as idades, são as maiores vítimas, ainda que casos envolvendo homens e meninos também sejam relatados por Ana em sua busca por derrubar os muitos mitos e tabus que cercam esse tipo de crime.
“É um assunto muito dolorido, desconfortável e foi difícil ouvir os depoimentos das vítimas. Muitas desenvolvem depressão, dificuldades de relacionamento ou podem se tornar agressivas. Prestar atenção no comportamento das crianças é uma das formas de perceber se há algo errado acontecendo.”, explica a jornalista.
Abuso – A cultura do estupro no Brasil é uma obra ousada, pesquisada com apuro e escrita com imensa sinceridade por uma das mais importantes jornalistas em atividade no país. Porém, mais do que tudo isso, é um livro extremamente necessário, que precisa ser lido por todos.
Ana Paula Araújo nasceu no Rio de Janeiro, porém, ainda criança, mudou-se para Juiz de Fora – MG. É formada em Comunicação pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e, aos dezoito anos, fez sua estreia no jornalismo como estagiária na Rádio Globo. Após migrar para a televisão e passar pelas bancadas do Bom Dia Rio e do RJTV, ela atualmente apresenta o Bom Dia Brasil e faz parte do rodízio de apresentadores do Jornal Nacional. Em 2011, Ana Paula fez parte da equipe do Jornalismo da Globo que ganhou o prêmio Emmy Internacional pela cobertura da ocupação do Complexo do Alemão no ano anterior, quando ficou por oito horas ininterruptas no ar. Abuso é seu livro de estreia.