A nova temporada de “Stranger Things“ abraça de vez a relação entre ficção científica, afetos e distorções da realidade. O que chama atenção é o modo como a série incorpora “Uma Dobra no Tempo”, clássico de Madeleine L’Engle, não como uma simples referência, mas como um eixo simbólico que ajuda a entender o que está acontecendo dentro do Mundo Invertido e, principalmente, dentro da mente de Vecna. A presença insistente do livro nas mãos de Holly Wheeler funciona como uma pista deixada à vista, quase como se o próprio roteiro dissesse que a chave para decifrar Hawkins já estava ali, silenciosa, esperando ser lida.

É assim que a temporada constrói um espelho literário que explica a série por dentro, reforçando temas como controle mental, perda de identidade, distorção de espaço-tempo e o papel dos vínculos afetivos na resistência ao mal.
Holly sempre ocupou o canto da narrativa, mas nesta temporada ela ganha corpo. O livro “Uma Dobra no Tempo” aparece literalmente colado à personagem, quase como uma ferramenta de interpretação da realidade que a cerca. L’Engle escreveu sobre jovens que atravessam dimensões para enfrentar A Coisa, uma entidade que transforma mundos vivos em ambientes de obediência absoluta, apagando diferenças e anulando a individualidade. A aproximação com Vecna se torna imediata.
A temporada usa Holly como o elo entre as duas obras, porque ela reconhece padrões que adultos ignoram. Ela enxerga semelhanças entre Hawkins e Camazotz, planeta dominado pela escuridão. A criança percebe a lógica da mente coletiva e identifica, com a sensibilidade de quem ainda acredita no impossível, que existem mais caminhos dentro do Mundo Invertido do que os personagens imaginam.
Camazotz representa um espaço regido por uma inteligência tirânica que controla pensamentos e comportamentos. A estrutura do Mundo Invertido desta temporada avança justamente nessa direção: uma paisagem mental construída por Vecna, ampliada pelas memórias de Henry Creel e modulada pela presença dos jovens que ele tenta capturar.
A série cria uma espécie de dimensão intermediária que vibra entre o real e o mental, semelhante à dobra espacial descrita no livro. Essa camada funciona como o refúgio que Vecna construiu para si mesmo, um território onde ele dita regras e remodela a lógica ao redor.
A analogia com Camazotz aparece dentro do próprio enredo. Personagens como Max, Will e Holly tentam decodificar aquilo que veem comparando a experiência com o livro. Esse mecanismo funciona como um reforço narrativo: o seriado passa a utilizar a obra de L’Engle como lente de leitura para aprofundar o significado de cada acontecimento.
Em “Uma Dobra no Tempo”, viajar entre dimensões exige reconhecer que amor, memória e conexão são forças capazes de atravessar qualquer fronteira física. A série parece recuperar essa mesma ideia para construir sua reta final.
A temporada sugere que a batalha contra Vecna ultrapassa o campo da força bruta e entra numa camada emocional, na qual os laços entre os personagens criam rachaduras dentro do domínio mental do inimigo. É essa lógica que conduz a aproximação entre Max, Holly e Will como equivalentes de Meg Murry. Cada um deles enfrenta um ponto cego interno, algo que precisa ser compreendido e superado para avançar.
A dobra no espaço-tempo, no universo de L’Engle, funciona como um movimento que reduz distâncias impossíveis. Em “Stranger Things”, o conceito se transforma em metáfora para a união dos personagens. A série parece indicar que essa força coletiva pode ser a única maneira de desmontar o sistema opressor que Vecna construiu.
A temporada aponta para um desfecho sustentado por afetos e memórias, muito alinhado à estrutura emocional de “Uma Dobra no Tempo”. A ideia de que o mal se expande através do controle mental e se enfraquece quando encontra resistência afetiva se repete nos dois universos.
Se a série continuar seguindo as pistas do livro, o final deve ser intenso, emotivo e guiado pela força das relações, como se Hawkins dependesse menos de poderes extraordinários e mais da capacidade daqueles personagens de permanecerem unidos diante do caos.
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