Depois do impacto cult de “Talk to Me”, os irmãos Philippou retornam com “Bring Her Back”, um drama de horror psicológico que mergulha ainda mais fundo na anatomia do luto, agora emoldurado por uma atmosfera ritualística sombria e relações familiares implodindo sob o peso do não-dito. Se a estreia deles já indicava um talento incomum para o horror como ferramenta emocional, aqui a promessa se confirma e se radicaliza.
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“Bring Her Back” acompanha dois irmãos que herdam uma casa isolada de sua mãe adotiva. O ponto de partida se revela apenas a superfície de um filme que, longe de repetir convenções de narrativas de possessão, entrega uma dissecação cruel sobre a impossibilidade de seguir em frente quando o luto vira identidade. A estrutura do filme é sustentada por um ritmo milimetricamente controlado, que alterna entre silêncios perturbadores e explosões de tensão visceral, onde o horror sobrenatural serve apenas como extensão de um trauma que já está lá desde o início.
A força dramática da obra repousa majoritariamente na performance devastadora de Sally Hawkins, que carrega uma carga emocional densa com precisão contida. Sua presença dá corpo ao vazio que o filme insiste em encarar: o espaço que o luto ocupa quando tudo o mais já foi corroído. Em cena, o corpo atormentado da personagem parece diluir a linha entre o que é possuído e o que já estava perdido.
A fotografia mantém o tom claustrofóbico e opressor, mesmo em planos abertos; os irmãos Philippou filmam o isolamento como se a própria paisagem estivesse contaminada. O design sonoro reforça essa lógica: há um desconforto constante, mesmo nas pausas, como se o filme respirasse ofegante ao lado do espectador. As cenas de possessão não seguem uma estética gore apenas por impacto: elas parecem derivar organicamente da dor emocional que antecede qualquer elemento sobrenatural. E é aí que “Bring Her Back” se diferencia: o ritual macabro é menos um mecanismo narrativo e mais uma metáfora do desespero de quem tenta forçar a continuidade de vínculos que já não existem.
Ao invés de se entregar aos clichês de jump scares e fantasmas vingativos, o filme estrutura seu terror a partir da tragédia humana. O verdadeiro horror aqui é o egoísmo emocional a recusa em aceitar o fim, a tentativa de manipular o passado com o pretexto do afeto, mesmo que isso destrua o outro no processo. É um comentário feroz sobre como o luto pode se converter em controle, e como a negação pode gerar monstros às vezes, internos.
“Bring Her Back” exige do espectador um envolvimento raro em filmes de gênero: não basta apenas se assustar, é necessário sentir o peso dos silêncios, das escolhas condenáveis e da falta de resolução. A jornada é incômoda e não oferece conforto, o que pode frustrar quem busca fórmulas mais tradicionais. Mas nesse desconforto está a ousadia da obra: o filme se recusa a ser reconfortante, porque luto, perda e trauma raramente são.
Os irmãos Philippou demonstram um domínio estético e narrativo notável para cineastas em início de carreira. O que poderia ser apenas um novo experimento dentro da fórmula A24 se afirma como um passo adiante em maturidade. “Bring Her Back” não é apenas um acerto técnico. É um filme que entende que o verdadeiro terror é olhar para quem amamos e perceber que, em nome do amor, podemos destruí-los.
Cruel, comovente, intransigente. O segundo trabalho dos Philippou confirma: há horror no luto, mas o luto também pode ser o horror.
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