“I Forgive You” é um manifesto de autonomia artística, de vulnerabilidade convertida em força, de uma artista que entende profundamente o peso de se despir diante do próprio público. Cynthia Erivo entrega um trabalho que se distancia por completo de qualquer formalismo radiofônico ou da previsibilidade dos moldes pop contemporâneos. O que existe aqui é honestidade brutal, traduzida em som, textura e intenção.
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É um disco que exige do ouvinte a mesma disponibilidade emocional que a própria artista entrega. Há peso. Há beleza. Há desconforto. Há transcendência. Cada camada, cada respiração capturada, cada escolha estética revela uma busca que vai muito além da simples elaboração de um repertório. Estamos diante de uma obra que tensiona constantemente os limites entre o íntimo e o performático, entre o sagrado e o profano, entre o som que conforta e aquele que rasga.
Tecnicamente, a construção do álbum impressiona pela complexidade das decisões harmônicas, pelo esmero das construções vocais e pela curadoria de timbres que fogem do lugar comum. Gospel, soul, pop alternativo, elementos acústicos, arranjos orgânicos e até ruídos não convencionais se entrelaçam em uma tapeçaria sonora que jamais se dobra às fórmulas. É um projeto que entende que coesão não significa linearidade, mas sim coerência emocional.
O rigor na produção é evidente. Tudo soa artesanal, construído em cima de silêncios calculados, de pausas que dizem tanto quanto qualquer acorde, de uma dinâmica que leva o ouvinte a experimentar não apenas a música, mas o próprio processo de cura que ela carrega. E sim, há catarse, mas também há contemplação, há acolhimento, há espaço para que a vulnerabilidade se manifeste sem ser romantizada ou editada.
É impossível não reconhecer o quanto “I Forgive You” escancara também uma urgência identitária. Existe aqui uma artista negra, queer, britânica, se apropriando da própria narrativa, da própria sensualidade, da própria potência emocional. E faz isso sem concessões, sem suavizar arestas, sem diluir dores e desejos para caber em prateleiras fáceis da indústria.
Este não é um álbum para consumo passivo. É uma obra para ser sentida, desconstruída, absorvida e, eventualmente, perdoada – no sentido mais honesto e humano da palavra. Porque, no fim, é exatamente sobre isso que Cynthia Erivo fala. Sobre a difícil, dolorosa e, ao mesmo tempo, libertadora tarefa de se perdoar. De aceitar todas as próprias versões. E de transformar cada cicatriz em matéria-prima para existir com ainda mais verdade.
Nota: 80/100
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