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Crítica: “Desobedientes” (Wayward)

“Desobedientes” surge como aquele tipo de série que começa parecendo familiar, mas logo se revela inquieta, estranha, disposta a tensionar o próprio gênero. Criada por Mae Martin, a produção mistura drama psicológico, suspense e ecos de terror social, construindo um ambiente sufocante na pacata cidade onde a Academia Tall Pines esconde segredos sombrios. A premissa é simples: adolescentes considerados “problemáticos” são enviados para uma instituição que promete reabilitação emocional, mas logo se descobre que há algo muito mais doentio por trás da fachada terapêutica.

Crítica: “Desobedientes” (Wayward)

A força da série está justamente em como ela desarma o espectador. Nada parece exagerado de início, o tom é quase naturalista, e essa escolha torna tudo mais perturbador quando o controle começa a desmoronar. Mae Martin entrega uma direção precisa e uma escrita que entende como o poder pode se disfarçar de cuidado. Evelyn Wade, interpretada por Toni Collette, encarna essa figura de autoridade magnética, quase messiânica, que transforma disciplina em culto e empatia em manipulação.

A dinâmica entre os adolescentes Leila e Abbie, interpretadas por Alyvia Alyn Lind e Sydney Topliffe, é o coração pulsante da narrativa. A amizade das duas serve de resistência contra a doutrinação de Tall Pines, enquanto o policial Alex (vivido pela própria Martin) tenta equilibrar a investigação com seus próprios traumas. Essa sobreposição de fragilidades cria um fio narrativo denso, humano e político, que reflete sobre o quanto o controle pode se travestir de salvação.

O texto de Martin flerta com o absurdo sem nunca perder o pé no real. A série sabe rir da própria sombra, inserindo momentos de humor quase cínico que aliviam o peso, mas nunca neutralizam o desconforto. Há algo de “Yellowjackets” no ar, mas sem o caos visual; algo de “The Program: Cons, Cults and Kidnapping”, mas com mais subjetividade e menos denúncia direta. “Desobedientes” prefere mostrar como a obediência é ensinada como virtude e como a rebeldia, nesse contexto, se torna ato de sobrevivência.

A estética fria e os silêncios longos funcionam como armas dramáticas. As paisagens bucólicas canadenses contrastam com o terror institucional, lembrando que o mal raramente se esconde em lugares sombrios ele prefere a luz das boas intenções. A montagem alterna entre o olhar juvenil e o policial, o que reforça o tema central da série: a fragilidade da percepção quando o poder controla a narrativa.

“Desobedientes” é um acerto de ritmo, forma e propósito. Sua crítica ao sistema punitivo disfarçado de reabilitação é direta e incômoda. Ao final, o espectador percebe que o verdadeiro horror da série não está nas paredes da escola, mas na sociedade que permite que instituições como Tall Pines existam.

“Desobedientes”
Direção: Mae Martin
Elenco: Mae Martin, Sarah Gadon, Alyvia Alyn Lind, Toni Collette
Disponível em: Netflix

Avaliação: 3.5 de 5.

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