“Emmanuelle” retorna em um novo corpo, mas carrega consigo um legado difícil de apagar. Esqueça qualquer tentativa de repetir o clássico erótico dos anos 70. Esta nova versão é menos sobre desejo explícito e mais sobre contenção estética, silêncio, atmosfera e códigos trocados em olhares que quase sempre dizem mais do que os diálogos. O filme trabalha com a sensualidade como abstração e com o erotismo como linguagem de poder.
Do mesmo diretor de “Noites Brutais”, “A Hora Do Mal” estreia em agosto no Brasil

O que existe aqui é menos narrativa e mais ambientação. O hotel luxuoso em Hong Kong se impõe como um personagem por si só, criando um ambiente de clausura sensualizada onde tudo parece possível, mas nada acontece de fato. Emmanuelle vaga por esse espaço com uma postura deliberadamente contida, investigando mais a si mesma do que o local. É um filme sobre expectativa, sobre o que se projeta no outro, sobre o que se deseja mas jamais se formula. Existe tensão, mas ela é rarefeita, quase etérea. Existe desejo, mas ele nunca se consuma plenamente.
A proposta de modernizar a personagem e subverter o olhar masculino do original é clara. Não há espaço aqui para a objetificação passiva. Emmanuelle é uma figura que controla o tempo, o ritmo e até a coreografia do próprio prazer. Mas essa reinvenção esbarra em um dilema delicado: a frieza estética afasta o público ao mesmo tempo que tenta provocar. A diretora quer criar erotismo sem pornografia, mas em alguns momentos parece criar apenas distância.
A montagem é pensada para provocar desconforto, com cortes bruscos, planos que duram mais do que o necessário e cenas que beiram o improviso calculado. Tudo colabora para uma experiência sensorial mais do que emocional. E talvez seja aí que o filme mais divide: para alguns, essa proposta será enigmática e instigante. Para outros, vazia e pretensiosa.
A nova “Emmanuelle” é mais ensaio visual do que enredo, mais estudo de personagem do que narrativa convencional. A trilha sonora é usada com extrema parcimônia, o que reforça o peso do silêncio e do som ambiente como instrumentos de tensão. A protagonista carrega o filme com uma presença magnética, que combina vulnerabilidade e controle com uma precisão quase clínica. Noémie Merlant imprime dignidade, inteligência e uma aura de mistério que sustentam até os momentos em que o roteiro falha em propor uma progressão dramática concreta.
Existe uma ambiguidade proposital no discurso do filme. Há quem veja nele um manifesto feminista velado. Há quem veja apenas um exercício de estilo. Talvez seja os dois. Talvez seja nenhum. Mas o que é inegável é que se trata de uma obra que se recusa a oferecer respostas fáceis. Ela exige um outro ritmo, uma outra sensibilidade. E cobra isso do espectador sem pedir desculpas.
“Emmanuelle” é um filme que divide, e precisa dividir. Porque escolhe provocar, não seduzir. Escolhe sugerir, não explicar. E mesmo com suas fragilidades, seu maior mérito é existir nesse lugar ambíguo, onde o erotismo deixa de ser espetáculo e passa a ser uma questão de presença, gesto e atmosfera.
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