Desde que surgiu, Lorde nunca teve medo de nadar contra a corrente. “Virgin” é a confirmação de que sua arte segue comprometida com a busca por identidade, não com a conveniência do mercado. Se a Nova Zelândia já nos deu paisagens épicas, agora ela entrega também um disco que se recusa a ser raso, mesmo sabendo que muitos esperavam algo mais direto, mais fácil, mais pronto para tocar em playlists genéricas.
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“Virgin” é o tipo de obra que não aceita ser engolida em uma única escuta. Sua arquitetura sônica exige atenção, mas recompensa com camadas. E o que mais chama atenção aqui não é a complexidade técnica, mas o quanto essa complexidade está a serviço da intimidade. Lorde não faz um álbum para agradar o algoritmo. Ela escreve como quem precisa dizer algo, e diz de um jeito que nem sempre é confortável.
A produção liderada por Jim-E Stack, com colaborações de nomes como Dev Hynes, Dan Nigro e Buddy Ross, constrói um ambiente onde o eletrônico é usado para expressar fragilidade, e não potência. Há uma pulsação viva, mas também há silêncio. Há sintetizadores, mas há espaço para que o ar entre nas músicas. É uma escuta que vibra entre o espiritual e o cru, entre o cerebral e o instintivo. A proposta de ser transparente, refletida na estética da era e na simbologia do próprio título, é levada a sério em cada detalhe. Nada aqui soa decorativo.
Lorde entende que seus álbuns são capítulos distintos de uma mesma investigação pessoal. Se “Pure Heroine” apresentou a alienação adolescente e “Melodrama” mergulhou no colapso emocional da juventude, “Virgin” funciona como um rito de passagem que mistura inocência com um senso brutal de consciência corporal, tempo e legado. Há algo ritualístico no disco, como se estivéssemos presenciando uma purificação em tempo real.
É importante também entender que “Virgin” não é um pedido de desculpas por “Solar Power”, mas sua consequência inevitável. O que muitos chamaram de dispersão, aqui se transforma em foco. O que parecia fuga, agora é confrontação. A escrita de Lorde continua firme, muitas vezes quase ensaística, e sua habilidade de fazer perguntas mais interessantes do que entregar respostas continua sendo um de seus maiores talentos.
Há quem vá rejeitar esse disco esperando a catarse pop de “Melodrama” ou a rebeldia minimalista de “Pure Heroine”. Mas isso seria como esperar que a mesma mulher exista em todas as fases da vida. “Virgin” não é sobre repetição. É sobre amadurecimento. Um amadurecimento que se expressa em microtexturas, escolhas vocais contidas e no uso inteligente do vazio como elemento narrativo.
Lorde está em outra frequência. E talvez isso incomode justamente por ser tão pessoal. O álbum não se curva às expectativas nem tenta convencer ninguém. Ele apenas existe, como uma confissão feita sem garantias de aceitação. Essa é a força do projeto. E também seu risco.
Ao fim da escuta, o que resta não é o impacto imediato de um hit, mas a sensação de ter atravessado um terreno íntimo, espinhoso, bonito e esquisito. Como todo processo de renascimento costuma ser. “Virgin” é um disco que convida mais do que entrega, que inquieta mais do que satisfaz. E é justamente por isso que vale tanto a pena.
Nota: 90/100
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