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Crítica: “O Jardineiro” (1ª temporada)

“O Jardineiro” é o tipo de série que, mesmo em silêncio, diz muito. Por trás de uma trama aparentemente simples, há uma construção narrativa que se alimenta da tensão psicológica, da herança emocional tóxica e da constante fricção entre pulsão e contenção. É uma obra que se propõe a explorar a quietude do trauma em vez do espetáculo do crime, e por isso mesmo, soa mais interessante do que grande parte do que se tem feito no thriller latino.

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Crítica: “O Jardineiro” (1ª temporada)

O texto é contido. A direção, calculada. Mas isso não significa frieza. O que move “O Jardineiro” é justamente o desconforto de habitar uma história onde a violência não é o clímax, mas o habitat. A série se recusa a tratar seus personagens como vilões e mocinhos em lados opostos de uma régua moral, optando por colocá-los em zonas cinzentas onde afeto e perversidade andam de mãos dadas.

Elmer, figura central da narrativa, representa esse vazio com camadas. Sua apatia não é só sintoma de um trauma, mas ferramenta de controle, manipulada pela figura materna em uma das relações mais sufocantes que a ficção recente produziu. A mãe não é só antagonista. É sistema. É doutrina. É manipulação estrutural travestida de cuidado. E é justamente essa ambiguidade que eleva a série para um lugar mais sofisticado do que o esperado.

Esteticamente, a série também acerta ao trabalhar a linguagem visual como extensão dos silêncios dos personagens. A direção de arte não busca realismo exacerbado, mas uma estilização discreta, quase sensorial, que reforça o isolamento emocional de Elmer. Nada é exagerado, mas tudo é inquietante. A trilha sonora entra como extensão emocional das cenas, sempre pontual, sem soar manipuladora, e amplifica a tensão onde o roteiro opta por sugerir em vez de escancarar.

É verdade que alguns personagens secundários soam artificiais ou pouco desenvolvidos, especialmente nas camadas mais cômicas ou caricatas da trama. Ainda assim, a espinha dorsal da série está bem sustentada por um elenco que entende a diferença entre intensidade e exagero. As performances carregam contornos sutis, onde os gestos dizem mais que os diálogos, e isso funciona especialmente bem quando a narrativa exige densidade psicológica sem recorrer à verborragia.

“O Jardineiro” também propõe uma crítica silenciosa à romantização da violência como instinto de proteção. O amor, aqui, não redime. Ele complica. A paixão não é uma libertação, é uma nova prisão e talvez mais cruel do que a primeira, porque tem a aparência da escolha. Quando Elmer se apaixona, o que está em jogo não é só a possibilidade de redenção, mas a descoberta do quanto ele já foi sequestrado emocionalmente antes mesmo de sentir algo.

Se há uma fragilidade, ela está na ambição de querer concluir ciclos demais em uma temporada curta. Certos arcos prometem mais do que entregam, e a conclusão, embora coerente, opta por um caminho mais previsível do que a própria trama sugeria ao longo de seus momentos mais potentes. Ainda assim, o saldo é positivo pelo que se propõe e principalmente pelo que evita ser.

“O Jardineiro” não é uma série sobre matadores a sangue frio, mas sobre os mecanismos que constroem esses perfis e os mantêm operando. É uma narrativa sobre condicionamento, culpa, desejo e, acima de tudo, controle. Não reinventa o gênero, mas oferece um olhar novo dentro dele. E isso, em tempos de tanta repetição, já é mais do que o suficiente para justificar sua existência.

Avaliação: 3 de 5.

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