Comemorando seus 50 anos, “O Massacre da Serra Elétrica“, lançado em 12 de outubro de 1974 (USA), é um dos marcos fundadores do cinema de horror e do gênero slasher. Sob a direção de Tobe Hooper, a produção independente se consolidou como uma das obras mais influentes e perturbadoras da história do cinema, abrindo caminho para uma nova era no terror. O filme chocou com sua violência gráfica e se destacou pela habilidade de criar uma atmosfera de medo tangível, utilizando recursos limitados e uma abordagem quase documental. Esse realismo visceral, tão distinto do horror estilizado de filmes como “Psicose“, transformou o longa em um clássico cult atemporal.
O enredo, por si só, é simples: um grupo de amigos que viaja ao Texas para investigar o túmulo vandalizado de um parente. O que se segue, porém, é uma jornada de pura sobrevivência, quando eles se deparam com a grotesca família Sawyer, que inclui o icônico Leatherface. Inspirado por eventos reais, como os crimes do assassino em série Ed Gein que também influenciou personagens como Norman Bates e Buffalo Bill, Hooper explorou os limites do horror físico e mergulhou nas profundezas da degradação humana e da violência social. Leatherface, com sua máscara de pele humana e serra elétrica, rapidamente se tornou um dos maiores ícones do terror, simbolizando um mal primal, quase incompreensível, que até hoje provoca discussões sobre a moralidade e a psicologia do horror.
As condições de filmagem foram tão brutais quanto o próprio filme. Com um orçamento irrisório de cerca de 140 mil dólares, Hooper e sua equipe trabalharam em temperaturas sufocantes no Texas, chegando a 43°C. Os atores, muitas vezes, tiveram que usar as mesmas roupas por dias seguidos, o que criou um cheiro insuportável no set. Gunnar Hansen, que interpretava Leatherface, chegou a cortar acidentalmente a mão de um ator com a serra elétrica, graças à exaustão e ao calor. Esse caos no set, no entanto, ajudou a imergir os atores na brutalidade que seus personagens enfrentavam, conferindo ao filme uma intensidade visceral e realista.
A estética crua do filme, marcada por câmeras tremidas e cortes abruptos, foi um reflexo das limitações técnicas que a produção enfrentava. O diretor de fotografia Daniel Pearl, que era novato na época, utilizou iluminação natural e uma paleta de cores desgastada que dava ao filme um visual quase documental. Essa escolha de estilo, combinada com o uso de efeitos especiais práticos e barulhentos sons industriais, ajudou a transformar o filme em uma experiência sensorial sufocante. Hooper chegou a sugerir que o filme fosse lançado como PG, acreditando que a ausência de sangue explícito poderia suavizar a classificação, mas o impacto psicológico da obra garantiu sua reputação como um dos filmes mais aterrorizantes da história.
Além de seu impacto técnico, “O Massacre da Serra Elétrica” estabeleceu convenções que se tornariam pilares do gênero slasher, como o assassino mascarado e silencioso e o uso de armas improvisadas. Filmes como “Halloween” (1978) e “Sexta-Feira 13” (1980) seguiram esse modelo, mas nenhum deles capturou o horror sujo e opressor que Hooper criou. O que torna “O Massacre” único é seu subtexto social: a família Sawyer é uma alegoria do colapso de valores rurais e do fracasso da industrialização americana. Os Sawyers, sobrevivendo à margem da sociedade, são uma crítica ao abandono de um estilo de vida que não se adaptou às mudanças, utilizando métodos arcaicos e violentos para sobreviver.
A produção também inovou na maneira como foi promovida. Hooper jogou com a linha entre realidade e ficção ao divulgar o filme como “baseado em fatos reais“, o que aumentou seu apelo sensacionalista. O público, já perturbado pelo cenário político e social dos anos 70, que incluía o escândalo de Watergate e a Guerra do Vietnã, encontrou no filme um espelho distorcido de suas próprias ansiedades. O medo de invasores, de uma ordem social desmoronando e da violência inexplicável — todos esses temas pulsavam na sociedade e foram habilmente incorporados por Hooper.
“O Massacre da Serra Elétrica” se tornou uma obra que toca em medos primordiais: o isolamento, a desumanização e o declínio social. Ao longo de cinco décadas, sua influência se mantém poderosa, inspirando cineastas como Wes Craven e Sam Raimi, e gerando discussões acadêmicas que o elevam a um patamar de obra de arte perturbadora e visionária, inegavelmente enraizada no horror, mas com ramificações que transcendem o gênero.