Existe uma ironia deliciosa quando um blockbuster abraça o próprio excesso e tenta transformar caos em espetáculo. “O Troll da Montanha 2” aparenta entender esse jogo, mas desvia justamente naquilo que o tornaria uma ameaça cinematográfica real: coerência, ambição e confiança no próprio folclore. O filme tenta atingir tudo ao mesmo tempo, mas entrega uma experiência que oscila entre o entretenimento imediato e a sensação de que havia um universo inteiro pedindo por mais profundidade.

A sequência recupera Andreas, Nora e o Capitão Kris diante de um novo colosso que desperta com uma fúria ancestral. O conceito é promissor, especialmente porque o folclore nórdico sempre funcionou como terreno fértil para metáforas de memória coletiva, mitologia natural e tensões culturais. Aqui, porém, esse repertório aparece como fundo de tela, não como força narrativa. A criatura avança em direção a Trondheim para ajustar uma dívida antiga, mas o impacto emocional desse retorno pouco se sustenta. O filme assume o gigantismo como seu principal músculo, embora raramente explore suas implicações dramáticas.
A tentativa de equilibrar aventura, ação e fábula mítica cria uma narrativa que se movimenta, mas não se fixa. Nada se acomoda o suficiente para ganhar dimensão simbólica. Os personagens parecem deslocados dentro da estrutura, muitas vezes reagindo mais ao formato do gênero do que à realidade interna da história. As motivações aparecem como lembretes, não como forças condutoras.
Mesmo assim, a direção busca compor momentos que impressionam pela escala. Há imagens que sugerem grandeza, principalmente quando o filme se entrega ao confronto direto entre humanidade e natureza. O problema é que esses momentos surgem isolados. O CGI trabalha com energia, mas nem sempre alcança organicidade. A fotografia tenta criar densidade com paisagens amplas e luz fria, porém o peso mitológico raramente se converte em atmosfera real.
O elemento mais interessante surge quando o filme flerta com a tradição folclórica que o originou. A promessa de um troll movido por eventos do passado abre espaço para leituras que poderiam envolver identidade nacional, tensões históricas e até reflexões sobre migração. Nenhuma dessas camadas se solidifica. O longa acena, mas não investiga. Aproxima as questões, mas não as transforma em estrutura. O resultado é um conjunto de ideias potentes que ficam suspensas, sem infiltrar o núcleo do conflito.
Ainda assim, há charme no absurdo. O filme se apoia em clichês assumidos e, às vezes, até celebra essa repetição como se fizesse parte da graça. O laboratório secreto, os protocolos governamentais exagerados, os personagens guiados pelo instinto heróico, tudo funciona como engrenagem para um tipo de entretenimento que sabe exatamente o que está replicando. É cinema pipoca que prefere respirar pelo humor involuntário e pelo gigantismo estilizado.
O elenco se esforça para extrair densidade de uma estrutura que não facilita muito. Ine Marie Wilmann sustenta Nora com foco e intensidade, enquanto Mads Sjøgård Pettersen e Kim Falck equilibram humor contido com senso de urgência. A dinâmica entre eles segura o ritmo nos momentos em que o filme parece perder tração.
“O Troll da Montanha 2” se apoia em ideias grandes demais para o espaço que oferece, mas ainda entrega um entretenimento que funciona pela energia, pela escala e pelo desejo de amplificar o próprio universo. A sensação que fica é a de um filme que vê longe, mas caminha pouco. Ainda assim, para quem busca um mergulho rápido no caos mitológico nórdico com criaturas gigantes e fissuras ancestrais, o passeio rende boas imagens e um bocado de diversão.
“O Troll da Montanha 2”
Direção: Roar Uthaug
Elenco: Ine Marie Wilmann, Mads Sjogard Pettersen, Kim S. Falck-Jørgensen
Disponível em: Netflix
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