Quando se fala de amores inesperados e corações despedaçados, “Todo Tempo que Temos“ coloca a audiência num carrossel emocional digno de uma montanha-russa. Florence Pugh e Andrew Garfield entregam uma química magnética como Almut, uma chef de cozinha de espírito indomável, e Tobias, o recém-divorciado tentando juntar os cacos de uma vida quebrada. É um filme que explora, de forma quase poética, o caos que o amor pode ser e as cicatrizes que ele deixa, tudo com um toque de humor, porque rir da vida às vezes é a única saída.
Sob a direção de John Crowley, a narrativa flui como uma dança entre momentos de pura leveza e socos emocionais. A não-linearidade da trama, habilmente costurada por Nick Payne, lembra como nossa memória brinca com o tempo: confusa, seletiva e sempre repleta de detalhes insignificantes, mas que, no fim, são tudo que nos resta. Se em um segundo estamos rindo das trapalhadas diárias, no próximo somos forçados a encarar o diagnóstico de câncer que paira como uma nuvem sombria sobre o casal. A vida real não avisa quando vai nos jogar no abismo, e o filme captura isso com precisão.
O que mantém o espectador investido não é apenas a jornada de Almut e Tobias, mas a autenticidade com que eles são retratados. Eles são falhos, vulneráveis, mas apaixonados e resilientes. Cada linha de diálogo soa como uma conversa real, aquela que se ouve em mesas de cozinha tarde da noite, quando o silêncio pesa mais que as palavras. Comparações com “Marriage Story” são inevitáveis, mas “Todo Tempo que Temos” oferece uma pitada extra de otimismo. É como se a montanha-russa emocional fosse revestida com uma camada de doçura que faz o choro no final ser uma espécie de alívio.
Florence Pugh brilha como de costume, entregando uma performance visceral, enquanto Andrew Garfield traz uma vulnerabilidade charmosa que só ele poderia incorporar. Não é exagero dizer que ambos alcançam um equilíbrio perfeito entre o drama e o humor, uma façanha rara em filmes que tocam em temas pesados como doença, perda e a inevitável despedida.
E aí está a grande sacada do filme: ele ri da dor. Entre momentos que fariam qualquer um desmoronar, há sempre uma piada ou uma situação irônica que desarma a tristeza. O tom de comédia dramática é uma aposta certeira, porque a vida é, no fim das contas, uma ‘tragicomédia’. Quem nunca riu de nervoso em meio a uma situação insuportavelmente triste? A piada do “corte de cabelo” de Almut, a metáfora dos “ovos quebrados” na cozinha, e até mesmo a competição secreta de patinação artística que ela insiste em participar sem contar para Tobias, tudo isso faz o público rir enquanto morde a língua de ansiedade pelo que virá a seguir.
E o que dizer da escolha de não seguir uma ordem cronológica? A sensação é de que se está vivendo a vida de Almut e Tobias por meio de uma lente caleidoscópica, fragmentos borrados, saltos temporais repentinos, flashbacks dolorosos que ressurgem quando menos se espera. Funciona brilhantemente porque, assim como na vida, o tempo não segue uma linha reta. E quando o relógio está contra nós, como é o caso de Almut, cada segundo conta.
As camadas de redenção e perdão se entrelaçam no roteiro, revelando a complexidade dos relacionamentos humanos. Tobias e Almut não estão apenas lutando contra o câncer, o divórcio, ou o peso do passado, eles estão tentando sobreviver ao amor, que, como o filme nos mostra, pode ser tanto um refúgio quanto um campo de batalha.
Se há algo a criticar, é que o filme parece terminar rápido demais. Mas talvez esse seja o ponto, “Todo Tempo que Temos“ nos deixa querendo mais, assim como Tobias quer mais de Almut, e como o público deseja mais do tempo que eles compartilham. Essa urgência, essa necessidade de prolongar cada instante, é um reflexo cru da realidade: o tempo nunca é suficiente, especialmente quando se ama profundamente.