Após exaltar de onde emana o poder verdadeiro no single “Eminência Parda”, Emicida encaixa mais uma peça em seu próximo projeto de estúdio, que ele tem preferido chamar de experimento social em vez de disco – “apesar de ser nobre conduzir uma experiência sonora por, mais ou menos, uma hora, é preciso ter cuidado para cultura da música não ser engolida pela cultura das plataformas”. Lançada pela Laboratório Fantasma e distribuída pela Sony Music, “AmarElo” é a segunda música apresentada pelo rapper paulista e também a faixa que dá nome ao novo trabalho que está sendo proposto por ele.
“No primeiro passo desse processo, a nossa intenção era que as pessoas se sentissem grandes ao olharem no espelho. Agora, a ideia é que elas observem ao redor e se enxerguem maiores do que os seus problemas, independente de quais sejam”, diz Emicida. Para isso, o artista convidou as cantoras Pabllo Vittar e Majur para participarem do registro. Elas dão voz ao poema “Permita que Eu Fale”, do próprio Emicida, e a um trecho de “Sujeito de Sorte”, de Belchior. “As duas trazem, em suas vivências e em suas obras, histórias bonitas a respeito de acreditar em si e de lutar contra o mundo para ser quem são”, pensa Emicida.
É emblemático e potente que, em pleno 2019, esses três nomes cantem os versos “ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro” – lembrando que: a cada 23 minutos, um jovem negro morre no país (segundo relatório do Mapa da Violência, de 2014); enquanto, a cada 20 horas, um LGBTQ+ tem morte violenta no Brasil, sendo mais de 72% dos casos assassinatos e 24% de suicídios (este levantamento foi feito pelo GGB – Grupo Gay da Bahia, mais antiga associação de defesa dos direitos da população LGBTQ+ no país).
“A música é cheia de mensagens importantes, atuais e que retratam a diversidade, a luta e a força que vivemos todos os dias. O valor social que ‘AmarElo’ carrega é enorme e vai promover reflexões que precisam, cada vez mais, ser levantadas”, reflete Pabllo.
“AmarElo” ganhou também um videoclipe impactante – gravado no Complexo do Alemão, na Zona Norte do Rio de Janeiro – com a participação de Emicida, Pabllo Vittar e Majur. O registro audiovisual abre com um áudio de uma pessoa próxima ao rapper que tentou o suicídio (hoje, o dono do depoimento está bem). Ainda compõem a narrativa personagens que têm as suas cicatrizes como coadjuvantes, não, melhor, figurantes.
“Dividir a cena com eles dois é um marco na minha carreira e, principalmente, na música brasileira”, define a cantora não-binária Majur. “É muita representatividade em um momento que precisamos ter voz. ‘AmarElo’ traz na sua poesia o retrato de um Brasil de multiplicidade e que ressignifica a sobrevivência de um povo que me identifico muito. Canta a busca por nosso lugar social”, completa.
Trata-se da concepção de um hino para todos aqueles que merecem apenas um destino final: o pódio.
Emicida concebeu a sua carreira de maneira que ela transcendesse as formas de gerenciar a trajetória de um artista. Em um momento da história em que o mercado era regido por vender discos e fazer shows, o rapper paulista e a Laboratório Fantasma prontamente entenderam que esse módus operandi era obsoleto e que, para existir com solidez no século 21, era necessário rever completamente essa lógica. “Daí, nasceu o que chamamos de experimento social. O que, de fato, conduzimos desde quando compreendemos a dimensão das primeiras visualizações em 2006, a produção e venda das mixtapes caseiras, a imersão nos programas de TV de grande audiência, as tours internacionais, a proximidade com o universo geek, os desfiles de moda, etc”, explica Emicida. Tudo isso faz parte do grande experimento social que demonstra – a cada etapa – a possibilidade real de transformar os lugares com música. “Agora, decidimos trazer este termo para a luz da ribalta e ilustrar de forma mais consistente como compreendemos o que é ser, em nosso tempo, um artista que muitas vezes vê a sua produção transcender, inclusive, a própria arte”, finaliza.
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