“A Hora do Mal” é um daqueles filmes que parecem surgir do nada, mas ocupam espaço demais para serem ignorados. Desde os minutos iniciais, já se sente a ambição estrutural, o controle absoluto de linguagem e o peso simbólico que transformam essa história de desaparecimentos infantis em algo muito maior, mais denso, mais sujo e, ao mesmo tempo, mais sofisticado. O novo longa de Zach Cregger é menos uma sequência a “Noites Brutais” e mais uma reinvenção do que se entende hoje por cinema de terror autoral. O que ele entrega aqui coloca o gênero em outro patamar.
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A cidade onde tudo acontece é genérica por fora, como tantas comunidades americanas brancas, confortáveis, blindadas pela ilusão de segurança. Mas basta o sumiço sincronizado de dezessete crianças para que o verniz comece a rachar. E o que emerge desse racha não é apenas o medo do desconhecido, mas o pavor de enxergar o conhecido sob outra luz. O mal, aqui, não vem de fora. Ele está dentro. Dentro das casas. Dentro das instituições. Dentro das certezas que a sociedade escolhe repetir até virar mantra.
O que faz “A Hora do Mal” ser tão impactante não é só sua premissa, e sim a forma como ela é destrinchada. O roteiro assinado por Cregger é milimetricamente pensado, mas a sensação ao assistir é a de que tudo está prestes a sair dos trilhos o tempo inteiro. A narrativa salta entre tempos, personagens e atmosferas com uma ousadia que só dá certo porque existe um domínio total do material. Cada segmento parece um filme em si, com seu próprio arco de tensão, ritmo, clímax e colapso emocional.
Ao contrário de “Noites Brutais”, onde o terceiro ato dividiu opiniões pelo desequilíbrio tonal, aqui Cregger acerta o compasso do início ao fim. O humor está presente, mas entra como ferramenta de tensão, não como alívio. O horror nunca perde o foco. A condução é seca, objetiva e profundamente desconfortável. Tudo parece sempre à beira do descontrole, mas nada escapa das mãos do diretor, que sabe exatamente quando esticar o silêncio, quando romper com o previsível e quando mergulhar na brutalidade.
A comparação com o filme anterior do diretor é inevitável, mas injusta. “Noites Brutais” era sobre espaço e monstros físicos. “A Hora do Mal” é sobre estrutura social e monstros morais. É um estudo de comunidade, de histeria coletiva e da capacidade quase insana de uma cidade inteira transformar o trauma em histeria e a histeria em julgamento. É um filme sobre luto, claro, mas também sobre culpa, sobre desinformação, sobre a necessidade patológica de encontrar um culpado quando o mundo rui e ninguém quer olhar para dentro.
A montagem é primorosa, com mudanças abruptas de ponto de vista que reorganizam o quebra-cabeça narrativo e mantêm o espectador em alerta constante. Cregger sabe exatamente o que mostrar e, mais importante ainda, o que esconder. A trilha sonora é usada com inteligência e impacto, criando atmosferas sufocantes em cenas que poderiam parecer banais. O uso de uma faixa de George Harrison em um momento-chave é, sem exagero, um dos grandes ápices musicais do cinema recente. Um gesto ousado, irônico e devastador.
No elenco, todos entregam com precisão, mas Amy Madigan é um evento à parte. Sua personagem não pode ser revelada sem estragar parte da experiência, mas a forma como ela domina a cena, oscila entre fragilidade e crueldade, e imprime uma tensão quase insuportável com mínimos gestos, é uma das grandes atuações do terror nos últimos anos. Julia Garner e Josh Brolin também são ótimos, mas é difícil não sair da sessão sem Madigan gravada na mente.
O final pode soar excessivo para alguns, mas faz sentido dentro da lógica interna da obra. Aqui, o clímax é tão mais simbólico quanto literal, e o exagero funciona como explosão acumulada de toda a angústia represada até ali. É o terror se apropriando da catarse para deixar claro que, mesmo que a verdade venha à tona, os danos já foram feitos e são irreversíveis.
“A Hora do Mal” é mais que um filme assustador. É um dos retratos mais ferozes, cínicos e desesperados sobre a sociedade americana pós-trauma. Sobre como o medo é manipulado, como a verdade é distorcida, e como a dor coletiva é constantemente sequestrada por discursos de poder. Zach Cregger comprova que seu domínio do gênero vai além da estética: ele entende o terror como linguagem para se falar de tudo o que o mundo prefere calar.
Difícil imaginar outro título em 2025 com tamanha força. E impossível sair do cinema sem sentir que viu algo importante. O tipo de filme que vai continuar te assombrando dias depois, não pelos sustos, mas pelas ideias que ele planta e deixa apodrecer dentro de você.
“A Hora do Mal”
Direção e roteiro: Zach Cregger
Elenco: Josh Brolin, Julia Garner, Alden Ehrenreich, Amy Madigan
Disponível em: nos cinemas a partir de 7 de agosto de 2025
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