M. Night Shyamalan talvez nunca consiga se livrar da expectativa de uma virada surpreendente. Desde que foi rotulado como o “mestre do plot twist”, ele carrega o fardo de sempre ter que chocar. Mas em “Batem à Porta”, o que mais impressiona não é a reviravolta, e sim a contenção. É um filme que mira o fim do mundo, mas se passa dentro de uma sala. A tensão é global, mas o espaço é mínimo. E essa escolha estética e narrativa faz toda a diferença.
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A premissa é simples, direta, e não perde tempo: uma família é mantida refém em uma cabana isolada por quatro estranhos que afirmam que o apocalipse depende de uma decisão moralmente impensável. É como se o fim dos tempos passasse a exigir justificativa emocional, e não científica. Não se trata de descobrir se o mundo vai acabar, mas por quê e mais importante: quem vai impedir.
A direção de Shyamalan aqui é mais limpa, mais disciplinada. Ele filma os rostos de forma obsessiva, como se estivesse mais interessado nas microexpressões de dúvida, dor ou fé do que em explosões ou efeitos climáticos. O verdadeiro suspense não está do lado de fora da cabana, mas dentro da cabeça dos personagens. O terror, aqui, é íntimo. Não há monstros à espreita, nem sustos calculados. Há ideias. Medo de perder, medo de escolher, medo de crer.
Dave Bautista surpreende como Leonard, não por subverter sua imagem física de durão, mas por dar peso emocional a cada fala, como se sua presença fosse tanto uma ameaça quanto um pedido de ajuda. A composição do personagem tem uma camada de ambiguidade fascinante: ele é o vilão? O profeta? Um fanático? Essa dúvida é o coração do filme, e Bautista segura tudo com dignidade e vulnerabilidade.
Há também algo potente no fato de a família em risco ser formada por dois homens gays e sua filha. O roteiro evita transformar isso em pauta, mas a tensão homofóbica está sempre no subtexto, adicionando uma camada política ao dilema ético. O amor aqui não é idealizado, mas funcional: é o elo que resiste mesmo sob ameaças que ultrapassam o físico. Shyamalan não discute o preconceito diretamente, mas cria uma atmosfera onde a suspeita e a exclusão parecem sempre à espreita.
Visualmente, o filme é econômico, mas elegante. A fotografia trabalha bem os tons fechados, explorando a luz natural que invade pelas janelas, o que reforça a sensação de aprisionamento e vigilância constante. A montagem aposta na lentidão, e isso pode desagradar quem espera ritmo de thriller. Mas esse compasso mais lento serve à proposta: “Batem à Porta” é sobre pressão psicológica, não adrenalina.
É verdade que o terceiro ato perde parte da força ao tentar oferecer explicações demais. O filme flerta com a necessidade de justificar seu universo, quando talvez a dúvida fosse mais interessante do que a resposta. Mas ainda assim, o final não compromete a experiência como um todo. Há uma tentativa sincera de dialogar com temas maiores: fé, sacrifício, paranoia coletiva, colapso moral.
“Batem à Porta” não é o Shyamalan das reviravoltas bombásticas, mas talvez seja o Shyamalan mais maduro dos últimos anos. Um diretor que parece menos preocupado em provar sua genialidade e mais interessado em construir tensão com silêncio, olhares e dilemas morais. É um filme que funciona menos como entretenimento escapista e mais como provocação ética.
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