Há algo de curioso em “Éden”, novo filme de Ron Howard. Um diretor conhecido por conduzir narrativas de apelo emocional e estrutura clássica mergulha, aqui, em uma experiência existencialista que desafia tanto sua própria filmografia quanto o olhar do espectador. O resultado é um paradoxo visual e conceitual: um filme que tenta dissecar o ser humano, mas se perde em sua própria ambição.

Inspirado em um mistério real ocorrido nas Ilhas Galápagos, “Éden” acompanha um grupo de pessoas que decide abandonar a civilização e construir uma nova sociedade em um paraíso remoto. O cenário paradisíaco, porém, rapidamente se transforma em um laboratório moral e é nesse ponto que Howard encontra terreno fértil para discutir o colapso das utopias. O diretor, em parceria com o roteirista Noah Pink, parece interessado em testar os limites da ideia de pureza humana quando afastada das estruturas sociais que a sustentam.
“Éden” é um filme sobre o que resta quando tiramos tudo o que nos define. E é justamente aí que ele se aproxima mais do fracasso do que da iluminação. Visualmente, o longa é impecável: há uma fotografia solar que contrasta com o crescente desespero dos personagens, e a câmera de Howard se movimenta com uma elegância quase contraditória diante do caos moral em cena. A direção encontra força em seus silêncios e em sua atmosfera sufocante, ainda que o roteiro nem sempre acompanhe essa maturidade.
Jude Law assume o papel de um homem que acredita ser o herdeiro espiritual de Nietzsche, um “super-homem” moderno despido de ilusões, e talvez também de humanidade. Sua atuação é o fio que sustenta o peso filosófico do filme. Ana de Armas, por outro lado, interpreta uma figura sedutora e manipuladora, um tipo de influência tóxica que parece antecipar a ruína coletiva. Já Sidney Sweeney é o contraponto emocional e ético, a âncora moral que tenta salvar o que resta de empatia naquele microcosmo deteriorado.
Apesar do elenco afiado, o roteiro revela fissuras importantes. Os diálogos frequentemente oscilam entre o poético e o didático, e a construção dos personagens carece de uma naturalidade que faria a experiência ser mais visceral. Em diversos momentos, “Éden” parece um rascunho de uma ideia grandiosa, um filme que tenta fazer perguntas imensas sobre humanidade, fé e poder, mas se perde na própria vontade de ser relevante.
Ainda assim, há mérito em ver Ron Howard se arriscando fora de seu terreno habitual. É raro testemunhar um diretor consolidado em narrativas lineares se aventurando em um suspense existencialista tão sombrio. “Éden” não é uma falha total é um erro interessante. Um filme que não se satisfaz com respostas fáceis e que, mesmo em seus deslizes, provoca uma reflexão incômoda sobre o colapso do ideal humano quando confrontado com sua própria natureza.
O final, com sua tentativa de contextualizar os eventos sob a legenda “isso realmente aconteceu”, soa quase irônico como se o próprio filme reconhecesse a fragilidade de suas certezas. “Éden” é menos sobre a busca por um paraíso perdido e mais sobre o inevitável fracasso de quem tenta recriá-lo.
“Éden”
Direção: Ron Howard
Roteiro: Noah Pink
Elenco: Jude Law, Ana de Armas, Vanessa Kirby, Sidney Sweeney
Disponível em: Prime Video
Duração: 2h09 | Gênero: Policial, Suspense
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