“Extermínio” é daqueles filmes que gritam alto desde a primeira cena, mas fazem isso de um jeito que não precisa forçar a barra. Não é sobre zumbis, vírus ou explosões. É sobre o que sobra quando tudo o resto desaba. É um filme que não fala de monstros: fala de gente. Da gente que sobra, da gente que perde, da gente que precisa reaprender a existir quando todas as estruturas desmoronam.
Lista: 10 melhores álbuns nacionais lançados no primeiro semestre de 2025

Na superfície, o enredo parece simples. Um homem acorda de um coma e descobre que a cidade está vazia. O mundo virou um cemitério urbano. Mas essa premissa básica é só o começo de uma espiral emocional e moral muito mais profunda. Jim, interpretado por Cillian Murphy, não apenas acorda para o apocalipse. Ele desperta para a crueldade de um mundo sem regra, onde o maior risco talvez não seja o contágio, mas a escolha.
A direção de Danny Boyle é um espetáculo à parte. Ele entrega um filme com cara de documentário caseiro, que evita o glamour do apocalipse hollywoodiano para apostar numa estética bruta, suja, quase caseira. A Londres vazia, filmada com câmeras digitais de baixa resolução, é tão silenciosa e opressiva que transforma o vazio em personagem. Não há trilha épica. Não há heróis com frases de efeito. Só o som do vento, dos passos, do medo.
Mas o mais perturbador em “Extermínio” não são os infectados que correm e urram. É o que acontece com os humanos que continuam humanos. O filme sugere que, sem estrutura social, sem policiamento, sem testemunha, a moral vira uma peça decorativa. Os militares que surgem mais adiante, supostamente como promessa de cura e organização, revelam o colapso final da civilidade. Eles mostram que o verdadeiro apocalipse não é biológico. É ético.
A atuação de Murphy é contida, mas absolutamente eficiente. Ele constrói Jim como um homem comum tentando entender um mundo sem lógica. Naomie Harris traz uma Selena que não romantiza a sobrevivência: ela é prática, direta, endurecida. E ao longo da jornada, o que vemos não é só a tentativa de escapar dos infectados, mas de escapar da transformação interna que esse novo mundo exige.
“Extermínio” não está interessado em sustos gratuitos. O que ele constrói é tensão. Atmosfera. Um mal-estar constante. E quando as cenas de ação aparecem, elas são brutais, sujas, sem coreografia elegante. Há uma violência desorganizada que não busca entretenimento, mas sim desconforto. Não se trata de espetáculo. É desespero.
Mas a maior ousadia do filme é a forma como ele constrói seus dilemas morais. Jim precisa decidir o que vale a pena preservar em um mundo destruído. A pergunta nunca é apenas como sobreviver, mas para quê sobreviver. A humanidade é colocada à prova, e o filme parece dizer que o vírus apenas revelou o que já estava ali, adormecido.
E há também a beleza escondida nesse caos. Momentos como o piscar das luzes de um apartamento ao longe, ou o silêncio de uma cidade sem barulho humano, revelam que mesmo nos escombros pode haver delicadeza. A esperança surge não como uma solução, mas como teimosia.
“Extermínio” é urgente, brutal, necessário. Não envelheceu mal. Pelo contrário, parece cada vez mais relevante em um mundo onde o medo, o isolamento e a quebra de confiança coletiva não estão mais restritos à ficção. É um filme que não apenas imagina o fim do mundo. Ele imagina o que resta depois dele.
E o mais assustador é que, no fim das contas, talvez a infecção não venha de fora. Talvez ela já estivesse em nós o tempo todo.
Fique por dentro das novidades das maiores marcas do mundo! Acesse nosso site Marca Pop e descubra as tendências em primeira mão.