“Malu” é uma obra que, à primeira vista, parece se desdobrar como uma comédia de costumes, mas logo revela a profundidade emocional de um drama familiar intenso e cheio de camadas. Dirigido por Pedro Freire em sua estreia como diretor de longas, o filme segue a história de Malu (Yara de Novaes), uma atriz desempregada que vive em uma casa caindo aos pedaços na periferia do Rio de Janeiro. Malu não só enfrenta as dificuldades de uma carreira em declínio, como também é obrigada a conviver com sua mãe, Lili (Juliana Carneiro da Cunha), uma conservadora de língua afiada, e sua filha Joanna (Carol Duarte), recém-chegada da França e com uma relação tão complexa quanto as outras.
O filme faz parte da programação da 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo. Para mais informações, basta clicar aqui.
A força de “Malu” reside nas tensões intergeracionais. São três mulheres, três personalidades, e uma casa que parece pequena demais para conter tanto passado não resolvido. A interação entre elas é natural, o que torna o filme não só doloroso, mas também incrivelmente realista. Há algo universal nas disputas familiares retratadas, especialmente quando essas gerações se deparam com suas memórias e valores, chocando-se como placas tectônicas sob o mesmo teto.
Freire, com sua direção naturalista, aposta em longas tomadas que permitem que o elenco brilhe em sua complexidade. Yara de Novaes entrega uma performance devastadora, imersa no caos emocional de Malu, que é ao mesmo tempo engraçada e profundamente trágica. A excentricidade da personagem é retratada com tal intensidade que, em muitos momentos, é difícil não sentir um misto de simpatia e desconforto, especialmente quando ela cruza a linha entre o excêntrico e o cruel.
Visualmente, o filme captura o lado menos glamoroso do Rio de Janeiro. A decadência física da casa reflete a ruína emocional da família. A cinematografia, por sua vez, é eficaz ao retratar essa intimidade sufocante, com enquadramentos fechados que enfatizam o peso do passado sobre essas mulheres. Essa escolha estética não só reforça a temática da memória e do legado, mas também amplia o impacto emocional do filme.
No entanto, “Malu” peca pela falta de um fio condutor narrativo mais claro. A sensação é de que a trama anda em círculos durante grande parte do filme, sem um destino claro até o terceiro ato. Esse excesso de repetições acaba minando o ritmo, deixando o espectador em busca de uma resolução que demora a chegar. A narrativa, por vezes, parece flutuar, dependendo quase exclusivamente das interações entre as personagens para manter o interesse.
A presença de Tibira (Átila Bee), amigo e “inquilino” de Malu, é outro ponto de interesse, adicionando uma camada a mais de tensão na trama. Embora seja um personagem coadjuvante, ele ocupa um espaço importante ao ser o único que parece compreender Malu em sua totalidade. Ainda assim, suas interações com as outras personagens revelam o abismo entre gerações, reforçando os conflitos centrais da narrativa.
“Malu” é um drama familiar que se perde em sua própria estrutura narrativa, mas que se sustenta em uma interpretação arrebatadora e momentos de pura verdade emocional. Pedro Freire traz uma obra que, apesar de suas falhas, ressoa com uma sinceridade crua, falando de gerações que se enfrentam em busca de uma compreensão impossível. A atuação visceral de Yara de Novaes é o que eleva o filme a outro nível, fazendo com que, no final das contas, “Malu” deixe uma marca.
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