Com direção de Leigh Janiak, “Rua do Medo: 1994” inaugura a trilogia da Netflix inspirada nos livros de R.L. Stine e apresenta uma proposta clara: unir a estética nostálgica dos anos 1990 ao formato slasher tradicional. Ambientado na fictícia cidade de Shadyside, Ohio, o filme constrói sua narrativa a partir de um ciclo de assassinatos brutais que assombra a comunidade há gerações, colocando um grupo de adolescentes no centro de uma conspiração sobrenatural.

A estrutura do roteiro respeita os clichês clássicos do gênero, mas tenta se diferenciar ao introduzir subtramas sociais e reviravoltas dramáticas que recontextualizam seus personagens. Ainda que derive fortemente de referências como “Pânico”, “Stranger Things” e outras produções teen, a direção encontra momentos de originalidade no uso estilizado da violência gráfica, na iconografia de seus assassinos mascarados e na ambientação que mescla a linguagem dos anos 90 com soluções visuais.
O visual do longa segue o padrão estético consolidado das produções Netflix: cores saturadas, paleta digitalmente refinada e câmera ágil. Ainda que eficaz na construção de tensão, esse acabamento estético compromete parte da autenticidade temporal da trama. As ambientações e objetos de cena remetem ao período, mas a condução narrativa soa demasiadamente moderna para a proposta de época. Essa dissonância visual enfraquece parte do realismo que o filme parece buscar.
Entre os maiores acertos, está a composição sonora. A trilha recheada de nomes como Radiohead, Nine Inch Nails e Pixies funciona não só como elemento de ambientação, mas também como reforço temático. A escolha por um repertório icônico não é aleatória: o filme se ancora na nostalgia como motor emocional. Essa dependência, no entanto, também limita a obra, que frequentemente recorre à referência direta como forma de validação cultural.
As atuações são consistentes, com destaque para Julia Rehwald no papel de Kate, cuja performance confere complexidade inesperada a uma personagem que poderia facilmente cair no arquétipo. Benjamin Flores Jr. assume a função de alívio cômico e investigativo com competência, embora sua caracterização remeta diretamente à fórmula de “Stranger Things”. Maya Hawke, mesmo em participação breve, estabelece o tom de violência e imprevisibilidade já na cena de abertura, em clara homenagem ao assassinato icônico de Drew Barrymore em “Pânico”.
Os antagonistas demonstram variação visual e conceitual, mas ainda carecem de identidade narrativa mais forte. A figura do Assassino da Máscara de Caveira funciona como o principal símbolo de ameaça, embora dependa excessivamente da familiaridade do público com a figura de Ghostface. A presença de vilões como o equivalente a Jason Voorhees e referências indiretas ao terror psicológico de filmes como “May” acrescentam diversidade ao panteão de antagonistas, mas nem todos têm espaço para se desenvolver de forma satisfatória.
Apesar de conter momentos de tensão bem construídos, o filme hesita em avançar narrativamente com a contundência que o subgênero exige. Parte disso se deve ao equilíbrio entre o horror físico e os dilemas emocionais dos personagens centrais, incluindo o relacionamento homoafetivo entre duas das protagonistas, elemento importante dentro da proposta de representatividade, mas que por vezes é tratado de forma superficial diante da ameaça principal.
A maior fraqueza do filme talvez esteja em seu ritmo desigual e em um primeiro ato que sugere pouca originalidade. Apenas com o avanço da narrativa é que a trama revela nuances mais interessantes, incluindo implicações históricas da maldição e um conflito mais amplo entre as cidades rivais de Shadyside e Sunnyvale. Ainda assim, a construção mitológica depende do desenvolvimento nas continuações, o que impede o primeiro filme de se sustentar com independência total.
“Rua do Medo: 1994” é um projeto com ambição e consciência de sua herança cultural, mas que ainda se apoia excessivamente em suas influências. Embora ofereça entretenimento satisfatório e pontuais lampejos de inventividade, falta-lhe coesão estética e identidade autoral para alcançar algo maior do que uma boa homenagem. Como abertura de trilogia, cumpre o papel de despertar curiosidade, ainda que a promessa de crescimento nos capítulos seguintes exija mais ousadia e menos reverência.
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