Crítica: Dua Lipa, “Radical Optimism”

Vamos começar com uma pergunta que talvez muitos estejam se fazendo: “Por que essa resenha demorou tanto para chegar até aqui?” A resposta é simples: assim como muitas coisas na música, certos discos demoram um pouco para fazer sentido. Você os ouve repetidas vezes e, no início, parece que não dizem nada. Mas, com o tempo, como um vinho que precisa respirar, “Radical Optimism” de Dua Lipa finalmente revelou seu sabor e saiu da zona de playlists de lojas de departamento (risos).

Crítica: Dua Lipa, “Radical Optimism” | Foto: Reprodução

“Radical Optimism” é o terceiro álbum de estúdio da cantora britânica-albanesa Dua Lipa, lançado em 3 de maio de 2024, pela Warner Records. Antecipado por três singles – “Houdini”, “Training Season” e “Illusion” – o disco chega em um momento crucial da carreira de Dua. A tão temida “maldição do quarto álbum” começa a surgir no horizonte, mas ela lançou esse projeto como um divisor de águas, marcando uma transição essencial em sua trajetória.

O anúncio de “Radical Optimism” veio em março de 2024, com uma transmissão ao vivo no Instagram, revelando o conceito, a capa e a lista de faixas. A proposta do álbum? Capturar a essência da juventude, liberdade e diversão. O conceito de “otimismo radical“, que nomeia o disco, foi apresentado a Dua por um amigo, anos antes, e acabou ressoando profundamente com a artista. Inspirada pelo termo, ela mergulhou em estudos sobre psicodelia, trip hop e o pop britânico, o que gerou um sentimento de “otimismo confiante“, que ela aplicou não só ao processo criativo, mas também à sua vida pessoal. Esse espírito foi transferido para o álbum, como se a música estivesse convidando os ouvintes a se conectarem com a sensação de que o melhor ainda está por vir.

Visualmente, a capa de “Radical Optimism” é simbólica. Ela retrata Dua flutuando em um oceano calmo enquanto a silhueta de um tubarão se aproxima. Uma metáfora clara de manter a serenidade em meio aos desafios da vida e, claro, da indústria musical. Afinal, ser otimista em um ambiente que exige constante reinvenção não é tarefa fácil.

Crítica: Dua Lipa, “Radical Optimism” | Foto: Reprodução

Agora, sobre a sonoridade: enquanto “Future Nostalgia” nos presenteou com o nu-disco cintilante e uma adoração pelos anos 80, “Radical Optimism” toma uma curva mais inesperada. Dua Lipa nos transporta para um território que evoca o dance-pop do final dos anos 90 e início dos anos 2000. Há guitarras acústicas, batidas mais leves, além de uma certa opulência nostálgica, o que não é coincidência. A atmosfera do álbum nos remete ao intervalo entre o fim das guerras de boybands e o início do milênio, quando o pop se misturava com influências do R&B e do trip hop. Se você espera uma grande balada poderosa que vai te fazer questionar sua existência, pode se preparar: é exatamente o que Dua entrega aqui, com direito a toda a carga emocional.

Dua não é a primeira diva pop a flertar com essa era. Caroline Polachek, por exemplo, lançou “Desire, I Want to Turn Into You” no ano passado, com alguns paralelos sonoros. E a comparação é inevitável em faixas como “End Of An Era” e “Maria”, onde até os timbres vocais trazem uma semelhança sutil. E quem poderia esquecer o retorno de Lady Gaga à pista de dança com “Chromatica”? No entanto, Dua parece menos dependente de floreios vocais grandiosos e mais focada em um equilíbrio sofisticado entre melodia e estrutura.

Crítica: Dua Lipa, “Radical Optimism” | Foto: Reprodução

Aqui está a grande virada: enquanto o álbum busca um som alegre e até dançante, há uma certa tensão persistente. Musicalmente, “Radical Optimism” é mais contido e calculado do que seus predecessores. A faixa “French Exit” é um bom exemplo disso, com sua produção intrincada que mistura pop e R&B acústico, exigindo uma melodia forte, algo que Max Martin sabe fazer tão bem. Kevin Parker, por outro lado, oferece uma produção mais experimental, às vezes inflexível, como se você tivesse que se adaptar ao estilo dele, em vez de ele se adaptar ao seu.

Isso nos leva à questão central: tematicamente, o álbum faz muito sentido dentro dessa paleta sonora. As letras exploram conexões efêmeras, momentos de paixão fugaz, mas sem uma base sólida. É um disco feito para o verão, mas com o olhar no outono, na transição para algo mais profundo. Dua parece estar à procura de alguém que corresponda à sua intensidade emocional, o que explica a “temporada de treinamento” que ela menciona. O título, muitas vezes criticado como algo de “empreendedora empoderada“, na verdade é um reflexo de alguém que busca incessantemente por uma conexão verdadeira, mesmo diante das dificuldades.

E aí está o ponto interessante: há uma maturidade evidente em “Radical Optimism”, mas também uma sensação de que tudo é muito meticuloso, talvez até demais. A produção brilhante e suave pode, em alguns momentos, tirar o brilho da espontaneidade que Dua trouxe em “Future Nostalgia”. Mas isso não significa que o álbum não tenha seus momentos brilhantes. “Whatcha Doing” nos surpreende com um baixo pulsante e uma troca de bateria eletrizante no segundo verso. “Maria” tem aquele shuffle acústico etéreo, enquanto “Falling Forever” destaca o que talvez seja a performance vocal mais impressionante de Dua até agora.

Crítica: Dua Lipa, “Radical Optimism” | Foto: Reprodução

No geral, “Radical Optimism” é um álbum que exige paciência, mas recompensa quem se dispõe a mergulhar fundo em sua proposta. Sim, há faixas mais fracas, como “Illusion”, que tem recebido duras críticas, mas também há faixas que mostram por que Dua Lipa continua a ser uma das artistas pop mais intrigantes da atualidade. Ela pode ser polida, técnica, quase científica na forma como constrói suas canções, mas não se pode negar que há uma complexidade emocional em jogo aqui. Se “Future Nostalgia” foi o álbum para festas, “Radical Optimism” é o álbum para refletir na volta para casa.

Nota Final: 75/100

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