É preciso mais do que coragem para fazer um disco como “Would You Still Love Me If You Really Knew Me?”. Exige vulnerabilidade, disciplina, entrega, mas também uma dose de cansaço: cansaço de si, das projeções alheias, da própria sombra. E é nesse estado limítrofe entre o colapso emocional e a reconstrução artística que Fletcher constrói seu terceiro álbum de estúdio. Um trabalho denso, cru, atmosférico e íntimo como nunca antes em sua discografia.
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Com 12 faixas autorais e produção executiva assinada pela própria artista ao lado de Jennifer Decilveo, o disco expande a sensibilidade pop de Fletcher para territórios mais contemplativos e menos voltados ao impacto imediato. Aqui, não há refrões explosivos, batidas grandiosas ou fórmulas para viralizar. O que se ouve é um pop emocionalmente desgastado, onde as baladas predominam e a poesia surge não na força das palavras, mas na coragem de se expor mesmo quando o que se sente não é bonito, limpo ou comercial.
“Boy”, lançada como primeiro single, talvez tenha confundido parte do público com sua roupagem mais superficial, mas o restante do álbum revela logo sua verdadeira missão: ser um espelho desconfortável das dores internas de uma mulher queer tentando decifrar seus próprios padrões emocionais. Canções como “Hi, Everyone Leave Please”, “Chaos” e “All of the Women” são peças-chave nessa jornada. Mais do que falar de amor, falam da ausência dele. Ou pior: da impossibilidade de encontrá-lo enquanto não se entende o próprio reflexo.
A produção do álbum acompanha essa proposta com parcimônia e sofisticação. Sai o maximalismo barulhento de discos anteriores, entra uma sonoridade que flerta com o minimalismo, modulando atmosferas com sutileza. São faixas construídas com cuidado: pianos melancólicos, sintetizadores etéreos e vocais que, por vezes, soam exaustos e isso é mérito, não falha. Porque é exatamente essa exaustão que sustenta o discurso do disco.
O que Fletcher faz aqui não é tentar agradar, e sim resistir. Resistir ao impulso de ser pop no sentido mais plástico. Resistir à ideia de que um disco precisa ser palatável para todos. Resistir à tentação de se esconder atrás de produções grandiosas quando o que se tem é dor, dúvida e desejo de desaparecer. “Would You Still Love Me If You Really Knew Me?” não busca redenção. Ele se contenta em existir como o retrato sincero de uma artista lidando com as consequências emocionais de estar viva, visível e vulnerável.
Claro, o álbum tem suas limitações. As baladas, em sua maioria, não são memoráveis isoladamente e em alguns momentos o disco parece girar em círculos líricos e melódicos. Mas a proposta não é sobre hits, e sim sobre catarse. A repetição, inclusive, parece intencional: como se a própria Fletcher estivesse tentando encontrar algum sentido em meio ao labirinto da própria mente.
Este não é um disco para ser entendido de primeira. É para ser absorvido em silêncio, respeitando o tempo das pausas, dos sussurros, dos vazios. É uma obra que recusa o espetáculo e abraça a inquietação como parte essencial do processo artístico. E mesmo que não seja o trabalho mais acessível da artista, é, com certeza, o mais honesto.
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