“Maníaco do Parque” tenta mergulhar na psique de um dos mais temidos assassinos em série da história brasileira, mas acaba boiando na superfície. O filme, que chegou à Amazon Prime Video em 18 de outubro de 2024, traz Silvero Pereira em uma performance digna de aplausos, a única âncora que impede a produção de afundar de vez. Sua representação de Francisco, o motoboy acusado de atacar 21 mulheres e assassinar dez, atinge um nível de intensidade que só agrava a frustração: o filme poderia ser muito mais, mas tropeça em cada oportunidade de aprofundamento.
A narrativa segue Elena, uma repórter iniciante vivida por Giovanna Grigio, em sua jornada para desvendar os crimes. E é aqui que surge o primeiro grande desvio. Ao invés de focar no horror e no impacto das ações de Francisco, o filme parece querer contar uma história pessoal da jornalista, que nada tem a ver com os terríveis acontecimentos que deveria investigar. De repente, o Maníaco do Parque deixa de ser sobre o assassino em si e vira um drama raso sobre a relação da jornalista com seu pai. E convenhamos, ninguém assiste a um filme sobre o maior serial killer brasileiro esperando esse tipo de subplot.
Essa decisão narrativa não só afasta o filme de sua premissa, como mina a seriedade da trama. A crítica que tenta fazer à mídia sensacionalista – que transforma assassinos em celebridades e esquece as vítimas é imediatamente sabotada. Em vez de oferecer uma reflexão sobre como esses crimes devastam vidas e moldam o medo coletivo, o filme faz exatamente o que critica: transforma Francisco em um astro do crime e ignora completamente as vítimas. Nenhuma delas tem desenvolvimento ou sequer uma presença real na história. Elas são apenas corpos no parque, instrumentos para o avanço de Elena e para o culto à personalidade do assassino.
A trilha sonora? Vamos apenas dizer que a palavra “aleatória” é um eufemismo. Não existe um fio condutor que amarre as cenas ao som; parece que a música foi escolhida com os olhos fechados. E quanto às inserções de feminismo? Uma tentativa mal executada que soa mais como um adendo forçado do que uma crítica social bem integrada.
A atuação de Silvero Pereira brilha em meio a essa bagunça. Ele encarna Francisco com uma visceralidade que traz à tona o perigo latente no personagem, um retrato assustador da banalidade do mal. Pena que sua performance é um oásis em um deserto de superficialidade. O roteiro tem a profundidade de uma pesquisa de Wikipedia, oferecendo diálogos que, no máximo, arranham a superfície da complexidade que esse tema exigiria.
A história real de Francisco de Assis Pereira, conhecido como o Maníaco do Parque, chocou o Brasil no final dos anos 90. Motoboy de profissão, ele atraía suas vítimas ao Parque do Estado, em São Paulo, sob o pretexto de oferecer trabalhos como modelo. Ao todo, foi acusado de atacar 21 mulheres, assassinando 10 delas. Sua captura em 1998 expôs ao país os horrores de seus crimes, além da falha coletiva em proteger as vítimas, muitas vezes ignoradas pela mídia em prol da fama que o assassino começou a ganhar. É essa história verdadeira, marcada pela dor das famílias e pelo trauma da sociedade, que o filme tenta retratar, mas acaba se perdendo nas próprias escolhas narrativas.
No final, “Maníaco do Parque“ não entrega o que promete. O foco está torto, a execução é rala e a crítica se perde em meio a dramas pessoais deslocados. Ao ignorar as vítimas e glamorizar, ainda que inconscientemente, o assassino, o filme se torna um desserviço. E mesmo com todo o potencial narrativo de uma história como essa, o resultado final deixa uma sensação amarga de oportunidade desperdiçada.
Se o objetivo era criticar a abordagem midiática sobre os crimes, talvez devesse começar dando o palco a quem mais importa: as vítimas, que aqui, assim como na vida real, acabam invisíveis.