Com “The History of Sound”, o diretor Oliver Hermanus entrega uma narrativa melancólica e estilisticamente refinada, que acompanha dois jovens — Lionel (Paul Mescal) e David (Josh O’Connor) — em uma jornada pela Nova Inglaterra para registrar as canções e histórias dos soldados sobreviventes da Primeira Guerra Mundial. O filme se estrutura como uma elegia sobre o amor, o tempo e a memória, fundindo a preservação oral do passado com o registro afetivo de uma paixão que floresce em silêncio.
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A primeira metade do longa é particularmente bem-sucedida. Há um lirismo discreto no modo como a câmera captura os dois protagonistas imersos nas paisagens rurais americanas, em um ritmo contemplativo que reflete o cuidado com que ambos escutam os depoimentos que coletam. A música funciona como o fio condutor emocional do filme, fazendo da trilha sonora um elemento tão vital quanto os próprios personagens. As canções folk arquivadas revelam tanto da história dos Estados Unidos quanto da intimidade contida entre os dois protagonistas.
Paul Mescal, novamente, comprova sua impressionante capacidade de sustentar emoções profundas com mínimos gestos. Sua atuação é marcada por uma contenção calculada, que espelha o contexto histórico da repressão ao afeto entre homens. Já Josh O’Connor entrega um desempenho mais instável, funcional dentro da dinâmica do casal, mas sem o mesmo magnetismo. Em poucos minutos de tela, Chris Cooper contribui com uma performance precisa e dolorosa, provando mais uma vez sua força interpretativa.
O problema central de “The History of Sound” reside na sua segunda metade, que, ao invés de expandir as tensões ou aprofundar o vínculo entre Lionel e David, opta por se retrair ainda mais. O filme toma uma decisão formal arriscada: manter grande parte da relação amorosa fora de campo, sugerindo que o próprio silenciamento é parte da experiência desses personagens. No entanto, essa escolha acaba tornando a obra emocionalmente distante em muitos momentos. Há ternura, mas ela parece encapsulada em camadas de abstração e estética que nem sempre se justificam dramaticamente.
A abordagem oblíqua da narrativa afetiva tem um propósito evidente: espelhar a invisibilidade imposta aos relacionamentos queer no início do século XX. Mas ao esconder deliberadamente os momentos mais íntimos, o filme corre o risco de privar o espectador da conexão que ele próprio tenta celebrar. Quando um gesto de carinho é interrompido e substituído por um salto temporal, o que se perde é mais do que apenas um momento: é o desenvolvimento da vulnerabilidade, da descoberta e da fricção emocional que sustentaria a densidade desse amor.
Ainda assim, o filme se recupera no final. A narração que encerra a história é de rara beleza, e consegue condensar os sentimentos que o roteiro parece relutar em expor plenamente. Embora soe imerecida frente ao distanciamento prévio, ela ainda reverbera por sua poesia e saudade.
“The History of Sound” é uma obra formalmente cuidadosa e honesta em sua intenção de preservar memórias pessoais e coletivas. Mas ao esconder tanto o que move seus personagens, termina por comprometer o alcance emocional de sua história. Há grande beleza em sua trilha sonora e delicadeza em sua direção, mas faltam riscos dramáticos e entrega afetiva para que a jornada seja, de fato, inesquecível.
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