Poucos filmes capturam com tanta intensidade a busca desesperada pela própria identidade como “Um Homem Diferente”. Em uma construção meticulosa de horror psicológico, Aaron Schimberg nos apresenta Edward (Sebastian Stan), um ator que se submete a uma transformação radical em busca de um novo rosto e, quem sabe, uma nova vida. Porém, o que ele ganha é um pesadelo de autodescoberta: o papel dos sonhos lhe escapa, e o que era para ser um renascimento se torna uma viagem sombria e obsessiva por um sentido que parece estar sempre fora de alcance.
“Um Homem Diferente” teve sua estreia mundial no Festival de Cinema de Sundance em 2024, conquistando a crítica e o público, com impressionantes 91% de aprovação no Rotten Tomatoes. Seu impacto ainda se desdobrou no Festival de Berlim, onde Sebastian Stan, irreconhecível e assombroso em seu papel, levou o Urso de Prata de Melhor Ator. Antes de sua estreia oficial, o público brasileiro teve o privilégio de conferir o filme em três sessões exclusivas na 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, o que adicionou ainda mais expectativa ao seu lançamento.
Ao focar na trajetória de Edward, um personagem desfigurado em busca de sentido e propósito, Schimberg nos convida a refletir sobre o que significa realmente enxergar alguém além das aparências. Edward vive uma realidade em que o sonho de ser alguém diferente se transforma rapidamente em um dilema existencial. Ele acredita que uma nova face lhe dará o papel dos sonhos, mas acaba aprisionado por essa nova identidade.
Aaron Schimberg constrói aqui uma narrativa que, ao abordar deficiências e desfigurações com uma profundidade rara, desafia o espectador a reconsiderar o próprio olhar. A decisão de ambientar essa reflexão em um suspense foi acertada: o terror psicológico do filme subverte convenções e usa elementos de comédia e até horror para criar uma experiência rica, na qual as ambiguidades dos personagens são cuidadosamente exploradas. Edward é um protagonista que se recusa a ser uma figura bidimensional. Em cada ato do filme, percebemos as sutis maneiras pelas quais a sociedade lhe impõe julgamentos e limites, muitas vezes inconscientes.
Sebastian Stan está absolutamente transformado. Sua atuação é um espetáculo em si; Stan se funde a Edward de forma tão orgânica que sua presença em cena é quase outra personagem. É o tipo de performance que só um grande ator pode alcançar, onde até a linguagem corporal se adapta à dor e ao desespero do papel. A intensidade de Stan aqui é comparável ao que ele apresentou em “O Aprendiz“, mas em “Um Homem Diferente” ele atinge uma profundidade de atuação que deve lhe render o reconhecimento que merece.
O filme de Schimberg, embora fictício, exibe momentos tão realistas e provocativos que quase se aproximam de um estudo social. Ele não se limita a criar um espetáculo de suspense psicológico, mas transforma cada cena em um convite para uma conversa maior sobre o que definimos como “normalidade” e as camadas de identidade. “Um Homem Diferente” é uma obra que permanecerá viva, provocando reflexões por muito tempo, e definitivamente uma das melhores produções de 2024.