“Forever Howlong” é o tipo de disco que exige uma escuta sem expectativa, como quem atravessa um território inexplorado com os ouvidos atentos e a mente desarmada. Porque o que ele entrega, na verdade, não é continuidade, e sim reconfiguração. E o mais curioso: a banda que parecia girar em torno de uma única voz encontrou amplitude justamente no silêncio dessa ausência.
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Desde a saída de Isaac Wood, muita coisa foi escrita, dita e lamentada. Mas o que “Forever Howlong” prova com elegância é que a identidade do Black Country, New Road nunca esteve fixada em uma figura. Estava, desde o início, na disposição de se desmanchar e se reconstruir. Esse terceiro álbum de estúdio consolida essa escolha. Não é uma tentativa de emular o passado, mas de entender o presente com outra linguagem sonora, outras texturas, outras vozes.
E que vozes. O trabalho coletivo entre Georgia Ellery, May Kershaw e Tyler Hyde não busca simetria. Pelo contrário. O poder do álbum está em como cada uma preserva sua identidade, criando um jogo de tensões e alianças, onde a multiplicidade substitui a liderança unilateral. É uma decisão estética e política. A banda encontra potência justamente nesse entrelaçamento de timbres e subjetividades.
Em termos de composição, a coesão vem da liberdade. Cada faixa parece querer uma coisa diferente, mas todas falam a mesma língua. Há um lirismo que alterna ingenuidade e amargura, ironia e doçura, sempre com um pano de fundo que sugere a busca por pertencimento em um mundo em constante deslocamento. Se o disco anterior era uma implosão emocional conduzida por urgência e colapso, “Forever Howlong” é uma expansão. Uma abertura para o lúdico, o acústico, o inesperado.
O trabalho de produção de James Ford é um dos pilares da experiência. A curadoria sonora aqui é meticulosa, mas leve, permitindo que cada detalhe respire. Flautas doces, cravos, bandolins e experimentações pontuais com instrumentos que beiram o improviso conferem um frescor raro. Em mãos menos cuidadosas, essa variedade poderia soar caótica ou ornamental, mas aqui ela sustenta o argumento central do disco: a música como campo aberto, onde o inesperado é celebrado.
Há também um cuidado narrativo menos linear e mais fragmentado. O disco não se constrói em clímax ou progressão tradicional, e sim em gestos, repetições e nuances. Essa estrutura mais solta pode soar desorientadora a quem espera a tensão contínua dos trabalhos anteriores, mas é justamente esse respiro que permite que os temas floresçam com naturalidade. A angústia ainda está lá, só que atravessada por alegria, companheirismo e uma nova relação com a dor.
“Forever Howlong” também é um álbum que fala sobre o tempo, mas não o tempo do relógio. É o tempo da convivência, da memória, da espera e da saudade. Um tempo que não se resolve em um refrão, que pede espaço, camadas e escuta atenta. Ao invés de melodias que querem ser eternas, o que temos aqui são composições que se aceitam transitórias, como quem sabe que tudo muda, inclusive a própria música.
O resultado final é um disco que não se propõe a ser maior ou melhor que os anteriores, mas diferente. E isso, para uma banda marcada por rupturas e reinvenções, é um gesto de integridade artística imenso. O Black Country, New Road poderia ter buscado segurança na repetição ou no culto nostálgico à figura de Wood. Escolheu, em vez disso, o risco. E encontrou, no processo, uma beleza desarmada, cheia de fissuras e encantamentos.
“Forever Howlong” é um álbum que acolhe o estranho, celebra o inacabado e abraça o múltiplo, sem precisar provar nada a ninguém. E, por isso, talvez seja o mais corajoso da discografia da banda até aqui.
Nota: 79/100
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