Jacob Collier encerra sua ambiciosa série “Djesse” com “Djesse Vol. 4”, resultando um projeto que atravessa anos, estilos e colaborações. Desde seu primeiro álbum, “In My Room”, o prodígio inglês conquistou o mundo com sua maestria técnica e vocais complexos, mas sempre dividindo opiniões quanto ao seu estilo ousado. Não é novidade: os arranjos de Collier desafiam convenções e exigem um ouvido atento, mas também correm o risco de se perderem na própria ambição. “Djesse Vol. 4” não foge desse paradoxo.
O disco foi indicado na categoria “Álbum do Ano” no Grammy de 2025.
Para quem acompanha a trajetória de Collier desde os primeiros volumes da série Djesse, é notável como ele passou de arranjador experimental do YouTube para um artista consagrado com influências que vão de Quincy Jones a Stevie Wonder. A série começou em 2018 com “Djesse Vol. 1”, e, agora, seis anos depois, Collier lança o que ele chama de a “culminância” da saga. Mas, como todo grande visionário, Collier oscila entre a genialidade e o erro, principalmente em um álbum de execução tão extensa, onde cada faixa é uma aposta em si mesma.
Com “Djesse Vol. 4”, Collier trouxe uma lista de colaborações impressionante, incluindo nomes como John Mayer, Lizzy McAlpine, Brandi Carlile e Shawn Mendes. No entanto, essa vasta coleção de participações ecléticas acaba por criar uma sensação de desconexão, tanto temática quanto sonora. Sem um tema unificador, o álbum parece um mosaico onde o artista “tira tudo do seu sistema”, mas nem sempre de maneira coesa. E, embora isso por si só não seja um problema, cria momentos onde o ouvinte se encontra mais aguardando o próximo experimento do que imerso na construção emocional da faixa atual.
As faixas lançadas antes do álbum completo “Never Gonna Be Alone”, “Wellll”, “Little Blue”, entre outras introduziram essa miscelânea com promessas ambiciosas, mas é no conjunto que percebemos a falta de uma narrativa mais linear. Collier, que por vezes busca mesclar pop com sua assinatura experimental, corre o risco de soar superficial em certos momentos, especialmente no que diz respeito ao conteúdo lírico, onde o pop pode pender para um tom kitsch ou infantil. Em faixas como “A Rock Somewhere”, sua tentativa de incorporar elementos da música clássica hindustani, por exemplo, não atinge a profundidade que artistas como Anoushka Shankar trouxeram em colaborações semelhantes. O experimentalismo musical de Collier, em certos momentos, soa como uma desculpa para a falta de substância emocional.
Mas seria injusto dizer que Collier falha em todos os aspectos. Em faixas como “World O World”, ele reafirma seu talento único para harmonias vocais elaboradas, onde cada nota parece ocupar um espaço preciso no cenário musical. Aqui, Collier nos lembra porque ele é uma força singular no jazz: uma fusão entre complexidade técnica e emoção genuína. “World O World” é uma peça que eleva o álbum a um patamar de profundidade que muitas faixas não atingem, mesclando letras que exploram amor e desejo com uma ambiguidade harmônica que encanta. É uma faixa que transcende o álbum em si e ecoa na memória, um lembrete de que Collier, quando acerta, acerta de verdade.
E, claro, há o ápice técnico de “Djesse Vol. 4”: sua capacidade de criar momentos quase cinematográficos através de passagens corais, cadências de la-la-la’s e riffs de guitarra cuidadosamente estruturados. O cover de “Bridge Over Troubled Water”, com Tori Kelly e John Legend, talvez seja uma das melhores releituras desta canção clássica. É como se Collier entendesse que, ao mesmo tempo que o menor uso de um motivo possa criar tensão e emoção, uma explosão sonora pode impactar profundamente.
Apesar das críticas e das oscilações, “Djesse Vol. 4” é o trabalho de um artista em plena exploração de seu potencial, o que pode implicar em imperfeições. Collier é, no melhor e no pior sentido, um músico audacioso, com uma visão expansiva que, como muitos gênios, parece maior do que ele mesmo às vezes consegue controlar. É o tipo de artista que nos lembra da frase que uma professora minha usava ao defender Ridley Scott como seu diretor favorito: “O sinal de um verdadeiro gênio é que ele bagunça as coisas com muitas ideias, mas quando acerta, acerta de verdade“. Jacob Collier, mesmo saltando de estilo em estilo, parece estar em busca da obra-prima perfeita, e “Djesse Vol. 4” nos faz esperar por qual será o seu próximo passo.
Nota final: 70/100