Crítica: “Betânia”

Betânia” é uma daquelas obras que abraçam o público de forma calorosa, ao mesmo tempo que o sacodem com as areias indomáveis dos Lençóis Maranhenses. O primeiro longa de Marcelo Botta, estrelado pela impressionante Diana Mattos, parece mais uma viagem emocional do que apenas uma história. O enredo gira em torno da matriarca Betânia, que retorna à sua cidade natal depois da morte do marido, e a partir daí, tudo vira um passeio sobre as dunas, imprevisível e, às vezes, um tanto desajeitado.

O filme faz parte da programação da 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo. Para mais informações, basta clicar aqui.

Crítica: “Betânia” | Foto: Reprodução

O filme estreou no 74º Festival Internacional de Cinema de Berlim e logo se destacou. E não é difícil entender o porquê. Botta, apesar de novato na direção de longas, mostrou um talento inato para capturar a alma do lugar e das pessoas. A câmera de mão, em muitos momentos, lembra os trabalhos de Benh Zeitlin, próxima, crua e, por vezes, inquieta.

No entanto, “Betânia” não é um filme perfeito, e está longe de ser. O primeiro ato traz a promessa de algo épico, com cenas lindamente filmadas, uma paleta de cores que parece saltar da tela e um retrato intimista das tradições locais. No entanto, à medida que o filme avança, as coisas começam a desmoronar um pouco. A segunda metade, que deveria explorar mais a fundo as dinâmicas familiares e os conflitos internos, se perde em escolhas narrativas questionáveis e em uma estranha subtrama envolvendo turistas. O quê? Sim, é isso mesmo, turistas. Se houvesse uma lista de elementos que poderiam ser cortados sem que ninguém sentisse falta, essa subtrama estaria no topo.

A trilha sonora também não escapa desse descompasso. Enquanto as músicas tradicionais e o som envolvente do Maranhão parecem transportar o público para dentro daquelas dunas, algumas escolhas mais modernas destoam. Em alguns momentos, a fusão funciona. Em outros, parece um remix mal ajustado de gêneros que não deveriam estar juntos numa mesma playlist.

Agora, seria injusto ignorar os pontos altos de “Betânia”. A interpretação de Diana Mattos é um espetáculo à parte. Ela dá vida à matriarca de forma visceral, transmitindo o peso de décadas de vivências e luto. A performance cativa não apenas pelo talento, mas pela autenticidade com que se apropria da personagem. E, claro, a cinematografia é simplesmente deslumbrante.

O filme também brilha em sua capacidade de abordar temas universais com um olhar genuinamente brasileiro. O luto, o choque entre o tradicional e o moderno, a luta pela identidade em meio a um mundo em transformação. Tudo isso é jogado na tela de forma sutil, em camadas que, se o espectador estiver atento, revelam comentários sociais e políticos que vão muito além das belas paisagens.

Apesar dos seus tropeços, “Betânia” é, acima de tudo, um filme humano. Há uma riqueza na forma como a cultura local é representada, desde os cânticos e danças tradicionais até a convivência familiar cheia de altos e baixos. O filme pode parecer bagunçado às vezes, mas é nessa bagunça que reside sua beleza. A vida, afinal, raramente é ordenada e linear.

Avaliação: 3 de 5.
Sair da versão mobile